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Apresentando “Phaenomena”, meu novo livro – post I: um personagem coadjuvante fala

Apresentando “Phaenomena”, meu novo livro – post I: um personagem coadjuvante fala

“Phaenomena” é o meu novo livro, um thriller cheio de suspense, ação e uma pitada de horror fantástico. Ele será lançado na próxima sexta-feira, 15 de fevereiro, na plataforma Kindle da Amazon, com uma promoção de lançamento.

Escrevi uma sinopse para o livro, é claro, mas parte de seu suspense é a “identidade” do personagem principal, então fazer apresentações e comentários traz junto o desafio de não se poder revelar muito. Assim, em vez de escrever um post sobre o tema do livro, sobre os personagens ou sobre possíveis inspirações, vou tentar algo diferente. Aí vão alguns parágrafos com um diálogo entre Miguel, um dos sete personagens coadjuvantes do livro, um investigador policial durão, e o escrivão de polícia a quem ele precisa se reportar sobre o evento que dispara os acontecimentos da trama. Miguel é um cara impulsivo e prático, embora seja sempre honesto e direto. Não acha a melhor coisa do mundo precisar se reportar a um parceiro de trabalho burocrata, e o colega sabe disso. Aí vai.

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Augustus deu uma tragada longa no cigarro, esmagou-o no cinzeiro ao lado da tela do computador; soprou a fumaça, um pouco nervoso, e voltou as mãos para o teclado.

“Você se importaria de sentar por alguns minutos?”

“Sim”, respondeu Miguel, ignorando o pedido do escrivão e permanecendo em pé, encostado na parede, encarando o outro. Augustus suspirou fundo e tentou se concentrar em digitar.

“Então… Você estava dizendo que… O Lucas e o Wesley foram encurralados dentro daquela loja da rede Easywork, na zona oeste da cidade…”

“Sim. No estoque, na parte de trás do prédio.”

De olhar aceso e mandíbulas tensas, Miguel se voltou para a janela na parede lateral da sala. Seus olhos estavam inquietos; ele via as casas vizinhas à delegacia de polícia, mas sua mente desenhava um quadro diferente, mapeando os passos recentes dos dois conhecidos ladrões, enquanto tentava conectar a informação e adivinhar seus próximos movimentos. O tom agudo da voz do escrivão era um pouco irritante para seus ouvidos.

“… Mas quando você chegou lá, não deu para entender claramente a cena, deu? Quer dizer, você não conseguiu avaliar toda a situação, o nível de ameaça, suspeitos, vítimas…?

“… Se você quer saber se eu arrisquei a vida de alguém, vá direto ao ponto, Gugu”, respondeu o detetive, ainda olhando pela janela.

“Ei!? Não me chama de ‘Gugu’. Eu só preciso que você detalhe os fatos. Você sabe, os riscos também serão considerados e…

“Estava uma bagunça infernal na loja quando eu cheguei, Gugu.” Michael cortou o escrivão. “Aqueles dois desgraçados invadiram o local de arma em punho; as pessoas estavam rastejando pelo chão, correndo para a rua, gritando; estava um caos do caralho. Eu fui em frente e aquele segurança…”

Paulo?”

“… Sim, o Paulo; ele me seguiu quando eu perguntei onde eles estavam, mas ele parecia estar tão assustado quanto as garotas dos caixas.” Miguel se virou e atravessou a sala até um bebedor instalado no outro canto; pegou um copo de plástico e apertou o botão, despejando água gelada nele. Tomou uma golada do copo e virou-se para o notário. “Assim que entramos no armazém… BAM!”

Augustus saltou da cadeira com um susto pela onomatopeia em alto volume de Miguel, mas manteve os olhos ainda focados na tela do computador.

“…Wesley atirou, como você disse.”

“Nós estávamos rastejando por trás das vigas da construção; sabíamos que eles estavam lá. Mas Wesley atirou primeiro. Duas, três vezes; só então conseguimos localizá-lo.”

“Então, ele atirou primeiro.”

“Você quer que eu fale de novo, cabeça-de-bagre?”

Augustus tossiu e digitou em silêncio por um tempo.

“Na sequência, você viu os civis.”

“Não. Na sequência, Lucas apareceu de trás dos estoques, do outro lado do galpão, e atirou. Então vimos que ele estava segurando o refém, o empresário”.

“E você…?”

“Eu, o quê? Você nunca entrou em um tiroteio, não é? Nós não podíamos fazer nada. Ele estava estrangulando o homem com o braço, usando-o como escudo. Mas o Wesley continuava vindo para cima da gente, do outro lado. E eles continuaram atirando. Foi quando eu vi as outras pessoas no fogo cruzado.”

“Você fez algum movimento também?

“Eu tive que pular para trás da coluna seguinte. Eu estava na linha de fogo do Lucas, e o Wesley estava nos encurralando. Eu segui para o lado também, ampliei minha perspectiva. E então eu vi as outras duas pessoas.”

“A menina com o cachorro… E o empregado.”

Miguel suspirou. Ele se lembrou da péssima sensação que tivera naquele exato momento. Lembrou-se do que pensara – não havia como não se derramar muito sangue naquele lugar… Sua mente vagou de volta àquele momento; ele esqueceu a voz irritante do escrivão de polícia por um instante. Naquele exato minuto, no galpão, ele teve certeza de que alguém naquela situação certamente morreria. Muitos, na verdade, se não a maioria deles. A merda estava pronta para acontecer. Miguel falou para si, em voz baixa.

“Eu não sei… Eu não sei como, mas… Ninguém havia levado um tiro…”

“…Desculpe?” Disse Augustus, erguendo os olhos da tela.

O olhar de Miguel escapou para janela novamente; ele estava claramente intrigado, e o escrivão notava. Augustus já havia ouvido três testemunhos sobre o evento, duas das testemunhas haviam permanecido no fogo cruzado, e todos pareciam compartilhar uma falta de clareza, especificamente sobre aquele momento, quando uma virada inesperada na situação parecia ter acontecido. No entanto, cada um deles, à sua maneira, citara que acreditava que alguém havia entrado no depósito. O empresário dissera que havia outro segurança, mas não tinha certeza; Paulo, que seguiu Miguel para o tiroteio, concordou que alguém havia surgido na cena, mas jurou que não havia outro segurança no local além dele, naquele momento. Augustus arriscou, tentando arrancar alguma informação nova de Miguel.

“… Nem mesmo o outro segurança?”

“… Que outro segurança?”

“Aquele que entrou no armazém, de acordo com o senhor Antônio, o empresário refém.”

Miguel desviou o olhar. Augustus esboçou um sorriso sutil com o canto dos lábios, como se tivesse obtido uma pequena vitória, na batalha que costumava ser conseguir um testemunho de Miguel. Mas o investigador estava pensativo. Ele respirou fundo.

“Eu não sei… De onde eu estava, eu só consegui ver… Ver uma espécie de vulto, eu… Bem, o fato foi que, de repente, Lucas parou de atirar em nós. Ele virou para o outro lado, deixou o refém fugir e começou a atirar e gritar como um louco, em outra direção. Então, tudo mudou”.

“… Tudo mudou?”

“Sim… Tudo mudou; Wesley recuou, a garota correu para nós e…” Miguel balançou a cabeça. Ele sabia a qual fato suas palavras levariam. Na verdade, ele gostaria de ter acabado com Lucas e Wesley, aqueles dois assassinos cruéis, há muito tempo. E esse pensamento fazia seu sangue ferver.

O investigador se virou e começou a andar até a porta.

“Miguel, você poderia por favor sentar por cinco segundos?”

“Desculpa, Gugu. Eu tenho muito o que fazer.”

“Miguel… Miguel!”

Augustus continuou gritando. No entanto, foi inútil. Miguel saiu da sala às pressas e, em não mais de um minuto, já estava ligando o motor do carro para sair do estacionamento da delegacia.

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